O local de trabalho sempre será de certa forma competitivo seja qual for o ramo de negócio em que está inserido. O problema está no ambiente e na inter-relação entre os colaboradores da empresa dependendo de como essa “competição” é administrada e incentivada. É muito comum encontrar ambientes de trabalho tóxicos que afetam todos ao redor e este ambiente é gerado pelo comportamento de uma ou várias pessoas que para manter sua posição ou seus interesses pessoais, utilizam de artifícios e táticas de manipulação para ganhar ou aumentar seu poder na empresa.

                Assim, com o objetivo de ganhar mais poder, o indivíduo faz a vítima questionar sua realidade, sua sanidade mental e isso funciona muito melhor do que você imagina para os manipuladores abusadores. É uma forma de abuso psicológico no qual informações são distorcidas e seletivamente omitidas para favorecer o manipulador abusador ou inventadas simplesmente com a intenção de fazer a vítima duvidar de sua própria memória, percepção e sanidade.

“O cargo ou qualquer tipo de casca exterior exerce um grande fascínio, porque representa uma fácil compensação das deficiências pessoais”. C. G. JUNG.

Como funciona?

É uma maneira de manipulação, marginalização e invalidação pessoal persistente e consistente que leva a vítima a duvidar de si mesma e, finalmente, a perder o próprio senso de percepção objetiva, identidade e autoestima. As declarações e acusações desse tipo de manipulador são frequentemente falsidades deliberadas, exageros sem fundamento, julgamentos negativos e ou ataques pessoais.

No local de trabalho, esse manipulador abusador pode ser um gerente, um diretor, um líder, um colega de trabalho ambicioso, etc. podendo vitimar indivíduos ou até grupos inteiros.

As diversas situações difíceis no trabalho projetam-se na negatividade acusatória persistente individual, em vez de evidências concretas, fatos sólidos, ou dados comprovados. É a política do quem é culpado e não de como podemos resolver o problema juntos. Os maus tratos persistem por um período de tempo, apesar de um histórico claro de colaboração, contribuições e realizações positivas do manipulado.

Quando confrontado, o manipulador abusador normalmente nega os maus tratos e pode se tornar bem defensivo, contencioso, desdenhoso e evasivo. Em vez de checar os fatos para solucionar problemas, ele ou ela pode aumentar o grau de manipulação e tornar se ainda mais agressivo, excessivamente emotivo ou se tornar um agressivo passivo.

Qualquer pessoa é suscetível a esse tipo de manipulação, uma técnica muito comum de abusadores, ditadores, narcisistas, gestores de equipe e líderes de culto. Isso é feito lenta e gradativamente para que a vítima não perceba o quanto foi submetida a uma verdadeira lavagem cerebral. Como exemplo didático, podemos observar no filme “À meia luz”, de 1940, como um homem manipula sistematicamente sua esposa a tal ponto em que ela realmente pensa que está enlouquecendo, fazendo com que ela duvide de si mesma e de seu senso de realidade. É uma lavagem cerebral psicológica! Podemos identificar neste filme e em muitos outros do mesmo gênero, comportamentos bem característicos de um manipulador, que incluímos em nossa lista mais adiante.

Como identificar esse comportamento?

Aqui segue alguns principais comportamentos, mas não estão limitados à apenas estes:

1-) Comentários públicos persistentemente negativos: individual, em grupo, reuniões, memorandos, relatórios, estatísticas de desempenho, ou outros cenários. Uma marca ou melhor, mancha negativa é amplamente utilizada ancorada em falsidades ou exageros do negativo, em vez de checar os fatos concretos, para prejudicar a credibilidade profissional e a reputação pessoal do manipulado. Exemplo: “O trabalho que sua equipe está fazendo é um desperdício de tempo e recursos. Como é que eu posso justificar o seu emprego?”

                2-) Exclusão profissional persistente e consistente, como por exemplo: segregação profissional velada, estagnação proposital no desenvolvimento profissional ou em promoção, e outras oportunidades.

3-) Narrativa negativa persistente sobre o desempenho, sobre a credibilidade, o produto ou o serviço do manipulado. Normalmente, a negatividade é baseada em julgamento pessoal e acusações tendenciosas, em vez de fatos e argumentos concretos.

                4-) Tratamento desigual persistente e comprovável em comparação com outros funcionários com experiência ou realizações semelhantes apesar de um forte histórico de colaboração positiva e contribuições dignas de honra. Significativamente, quando questionado sobre o assunto, o manipulador abusador pode apontar e culpar o manipulado por ser a causa da sua própria vitimização. O resultado da manipulação crônica é que ela pode fazer com que o manipulado se sinta “menor” como membro da equipe, colaborador ou fornecedor de produto ou serviço. Pode até começar a se questionar sua própria credibilidade profissional e sua autoestima pessoal, imaginando que o manipulador abusador está certo em seus julgamentos e acusações, apesar das evidências mostrarem o contrário.

5-) Fofocas negativas persistentes sobre as características profissionais e ou pessoais do manipulado. As fofocas negativas contínuas também são uma forma de agressividade passiva.

6-) Humor negativo persistente e sarcasmo ou deboche. Expressar hostilidade ou condescendência disfarçada de humor, sarcasmo para provocar, deboche para zombar, pôr pra baixo e marginalizar muitas vezes seguidas, só de “brincadeira”.

7-) Intimidação velada e intimidação persistentes e verificáveis no local de trabalho. Exemplo: “Você não gosta do jeito que eu falo? Então, quem mais vai contratar você?” ou “Se não gostou do que eu falei, resolve com você que o problema é seu”.

😎 Eles contam mentiras descaradas. Você sabe que é uma mentira direta. No entanto, eles estão lhe dizendo essa mentira de uma forma séria. Por que eles são tão descarados? Porque eles estão criando um precedente e depois que eles contam uma grande mentira, você não tem mais certeza se algo que eles dizem é verdade. Aqui o objetivo é mantê-lo instável e desequilibrado.

                9-) As ações não correspondem às suas palavras. Ao lidar com um indivíduo manipulador abusador, observe o que eles estão fazendo e não o que estão dizendo. O que eles estão dizendo não significa nada; é só conversa. O que eles estão fazendo é onde está o problema.

                10-) Eles negam que alguma vez disseram algo, mesmo que você tenha provas. Você sabe que eles disseram que fariam algo; você sabe que ouviu mas eles negam e isso faz você começar a questionar sua realidade e sua sanidade mental pensando, “talvez ele(a) nunca disse isso” ou “acho que ele(a) quer dizer outra coisa. E quanto mais fazem isso, mais você questiona sua realidade e passa a aceitá-la.

                11-) Usam como munição o que está próximo e querido para você. Eles sabem o quão importante seus filhos são para você e sabem o quanto sua identidade pessoal e profissional é importante para você. Essas podem ser uma das primeiras coisas que podem ser atacadas. Se você tem filhos, dizem que você não deveria ter tido esses filhos, dirão que você seria uma pessoa digna se não tivesse uma longa lista de características negativas ou seja, atacam a base do seu ser.

                12-) Sabem que a confusão enfraquece as pessoas. Os manipuladores abusadores sabem que as pessoas gostam de ter um senso de estabilidade e normalidade. O objetivo deles é desenraizar isso e fazer você questionar constantemente tudo e a tendência natural dos seres humanos é olhar para a pessoa ou entidade que o ajudará a se sentir mais estável.

13-) Eles desgastam você com o tempo. Essa é uma das coisas traiçoeiras sobre a manipulação e isso é feito gradualmente e consistentemente ao longo do tempo. Uma mentira aqui, outra ali, um comentário malicioso de vez em quando e então começa a aumentar de intensidade. Mesmo as pessoas mais inteligentes e mais conscientes podem ser sugadas para isso pois é muito eficaz. Analogicamente falando, é como se fosse fritar o sapo ainda vivo na frigideira: o calor aumenta lentamente, para que o sapo nunca perceba o que está acontecendo com ele.

                14) Dizem a você ou aos outros que você é louco. Essa é uma das ferramentas mais eficazes do manipulador abusador porque é usada para desprezar seu ponto de vista frente aos outros. Eles sabem que se eles questionam sua sanidade, as pessoas não acreditarão em você quando você diz que ele(a) é abusivo(a) ou que está fora de controle.

                15-) Eles tentam alistar as pessoas contra você. São mestres em manipular e encontrar as pessoas que eles conhecem que os apoiarão, não importa o quê, e eles usam essas pessoas contra você. Eles fazem comentários como: “Essa pessoa sabe que você não está certo” ou “Essa pessoa sabe que você também é inútil”. Mas lembre-se de que isso não significa que essas pessoas realmente quiseram dizer essas coisas, pois um manipulador abusador é um mentiroso convicto. Quando eles usam essa tática, você sente que não sabe mais em quem confiar ou em quem recorrer e isso o leva de volta ao manipulador abusador e é exatamente isso que eles querem. O isolamento lhes dará mais poder sobre o controle sobre você.

16-) Eles projetam. São mal caráter, trapaceiros, mentirosos, enganadores, desonestos, egocêntricos, narcisistas e manipuladores mas estão constantemente acusando você disso. Isso é feito com tanta frequência que você começa a se defender e se distrai com o próprio comportamento deles.

17-) Lançam esporadicamente um reforço positivo para confundir você. Essa pessoa que está te cortando, dizendo que você não tem valor, agora passa a te elogiar por algo que você fez e isso pode adicionar uma sensação de desconforto, pois você pode pensar: “Bem, talvez eles não sejam tão ruins assim”. Não se engane, eles são! Essa é uma tentativa meticulosamente calculada para mantê-lo fora de controle e novamente, de questionar sua realidade.

 

Quais os sinais para a vítima?

                1-) Você se pergunta várias vezes: “Será que eu sou sensível demais?”. “Será que não sou resiliente o suficiente?”

                2-) Com tantas coisas aparentemente boas na sua vida, você não entende por que já não está mais feliz e pode culpar outro aspecto da sua vida.

                3-) Se sente confuso constantemente ou até mesmo se sente maluco.

                4-) Duvida de si mesmo constantemente. Se pergunta se realmente é “bom o suficiente”.

                5-) Você cria desculpas frequentemente para seus amigos e sua família e principalmente para si mesmo para justificar o comportamento manipulador e abusivo do seu parceiro/colega/chefe.

6-) Você começa a esconder informações dos seus amigos e da sua família para que não tenha que explicá-las ou inventar desculpas, quando já está cheio de dar desculpas. Você começa a mentir para evitar ser posto para baixo.

                7-) Tem ideia de que algo está muito errado, mas nunca consegue expressar claramente o que, nem para si mesmo. Você tem dificuldade para tomar decisões fáceis.

😎 Você sente que costumava ser uma pessoa muito diferente, mais confiante, mais divertida e mais relaxada.

9-) Você se sente sem esperança e desanimado. Sente que já não consegue mais fazer nada certo.

 

O que devo fazer?

                A primeira coisa à se fazer é estar sempre atento nas inter-relações pessoais para avaliar honestamente e sem julgamentos o comportamento das pessoas e principalmente a sua reação à esses comportamentos. É preocupante se você é afetado(a) simplesmente com o que uma ou outra pessoa diz sobre você ou de algo que você gosta, pois assim você estará desprotegido(a) com o que pode vir de qualquer um. Mas uma análise profunda pode revelar quem realmente você está tentando agradar, pois para a maioria das pessoas julgar é muito mais fácil que raciocinar e é esse mecanismo que mais se utiliza. Livre de críticas e julgamentos ninguém estará, mas não é por conta das críticas e julgamentos que você deve se ater à elas sem antes avaliar criticamente se existe fundamento e o que isso vai de encontro com o seu plano de vida.

“Pensar é difícil, é por isso que as pessoas preferem julgar.” [C. G. JUNG].

                A segunda coisa a avaliar são os ganhos que você está tendo nessa relação, podendo ser classificados em ganhos primários e ganhos secundários, onde simplificadamente são ganhos de ordem afetiva e de ordem financeira. Essa reflexão pode ajudar muito na avaliação geral da situação, porém não é tarefa fácil, pois os mesmos podem ser conscientes ou inconscientes. E, neste caso o processo de análise com a ajuda de um analista profissional pode trazer conteúdos importantes no processo de autoconhecimento e no caminho da individuação rumo ao Self.

                “A individuação é um processo de diferenciação que tem por meta o desenvolvimento da personalidade individual. Assim como o indivíduo não é um ser isolado mas supõe uma relação coletiva com sua existência, do mesmo modo o processo de individuação não leva ao isolamento, mas a um relacionamento coletivo mais intenso ou geral”. [C. G. JUNG].

“A individuação, portanto, só pode significar um processo de desenvolvimento psicológico que faculte a realização das qualidades individuais dadas; em outras palavras, é um processo mediante o qual um homem se torna o ser único que de fato é.” [C. G. JUNG].

                A terceira coisa a se fazer é entender e estipular claramente os seus próprios limites com base em seu plano de vida e utilizá-los sempre que for necessário, pois estamos sempre sendo provados mesmo que sutilmente e com isso, se não estivermos atentos podemos acabar por enganar a nós mesmos e assim nos arrepender no futuro quando a escolha por esse caminho nos alertar conscientemente seja através de uma grande frustação ou seja inconscientemente até mesmo através de doenças psicossomáticas como depressão, taquicardia, vaginismo, insônia, problemas de ereção, entre outras.

 “Essas identificações com o papel social são fontes abundantes de neuroses. O homem jamais conseguirá desembaraçar-se de si mesmo, em benefício de uma personalidade artificial. A simples tentativa de fazê-lo desencadeia, em todos os casos habituais, reações inconscientes: caprichos, afetos, angústias, ideias obsessivas, fraquezas, vícios, etc. O “homem forte” no contexto social é, frequentemente, uma criança na “vida particular”, no tocante a seus estados de espírito. Sua disciplina pública (particularmente exigida dos outros) fraqueja lamentavelmente no lar e a “alegria profissional” que ostenta mostra em casa um rosto melancólico.” [C. G. JUNG].

 

Por Gláucio Parazzi

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